Aproveite nossa oferta de inauguração, oferta especial para e-books

Da voz à palavra: literatura afro-brasileira em foco

Literatura desde os primórdios foi sinônimo de nobreza, de requinte e de  poder. Aqueles que detinham o poder do livro eram os que detinham a maior riqueza de todas: o conhecimento. No cristianismo, pertencia ao clero a riqueza literária produzida dentro e fora de seus domínios.  Os sistemas baseados no capitalismo já davam sinais, logo, formas de se gerar e concentrar em uma pequena parcela da população todos os privilégios resultantes da detenção de poder. 

A literatura produzida no período colonial, além de se inspirar em padrões europeus, esteve por muito tempo submetida a um colonizador que, conforme afirma Bonnici (1998), dominava e emitia pareceres sobre a forma literária, sua publicação e distribuição. É preciso lembrar o óbvio: a população negra brasileira foi privada à arte. 

Considerando todas as mazelas sociais: direitos humanos negados, falta ou pouca informação, nenhuma formação acadêmica, acesso restrito ao conhecimento, a eventos artísticos, às bibliotecas, o sujeito negro na literatura – e nas ciências em geral – teve seu reconhecimento limitado.

Ainda existem poucos nomes de literatos(as) negros(as) exaltados na literatura brasileira: Cruz e Souza, Lino Guedes, Luiz Gama, Lima Barreto, Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus: quais lugares ocupam esses nomes nos cânones literários?

Quando falamos sobre gênero e etnia, muito dificilmente conseguimos citar dez nomes escritoras negras nacionalmente reconhecidas. As possibilidades a elas foram negadas, não somente excluídas pelo racismo, mas também pelo machismo que, depois de 400 anos, ainda reduz nossos lugares de fala. Onde estão Maria Firmina dos Reis, Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo no cânone literário?

Virginia Woolf, reconhecida escritora britânica do início do século XX, autora de “Mrs. Dalloway”, disse que “a mulher precisa de um espaço todo seu e uma renda para poder escrever”, por isso pergunto a vocês: onde a mulher negra encontraria o seu espaço na literatura se, naquela época, ainda exercia os papéis de amas de leites, lavadeiras ou concubinas? Onde encontrariam espaços para escrever se viviam situações precárias? Qual seria a fonte de apoio financeiro se estavam no topo dos índices de celibato?

A mulher negra precisa de espaço psicológico e uma renda independente para conseguir inscrever-se não só na literatura, mas no mundo. 

A pessoa negra surge representada em escravos do Romantismo, nas mulatas do Realismo, nas bruxas e prostitutas da sátira de Gregório de Matos, mas onde está sua voz, suas histórias e sua autorrepresentação? Esse espaço, que deveria ser infinito, para nós continua limitado.

Perpetuam  a falácia de que tudo isso é “coisa do passado”, juram – de pés juntos – que no mercado editorial existem as mesmas possibilidades, no entanto, desculpo-me se acabei com o otimismo promissor do leitor e peço: parem de ser insistentes!

Falaram sobre nós, sobre nossos corpos, sobre nossa sensualidade, sobre nossas raízes, religiões e cultura, contudo, não nos permitem contar nossas próprias narrativas. Assim mesmo disse Vinícius de Moraes, em “Samba da Benção”: “o samba é branco na poesia, mas é negro de coração”. 

Seria antipoético desconstruir o romantismo das letras do saudoso artista, mas bonito mesmo seria dizer que o samba é negro na poesia e no coração também.

Literatura e beleza se fazem disso: do sentir, do viver e do ser. Pessoas negras sempre estiveram presentes nessa construção.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BONNICI, Y. . Introdução aos estudos das literaturas pós-coloniais. Mimesis: Bauru, v. 19, n. 1. , p. 07-23, 1998.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *